Karola Lobo

celas

Ela sentiu uma gota escapar. Quente. Os pelos do pescoço arrepiaram com a vontade cortante.

Você pode segurar o xixi, por favor? Faltam só vinte minutos e, se você sair e outra pessoa ficar no seu lugar, a sala perde o controle.

A voz metálica no interfone passava o comando do dia: Beba menos água da próxima vez, por gentileza. O tratamento passivo-agressivo era o modus operandi da Instituição.

O inquérito inesperado ressoava no seu peito dolorido. Seu rosto pegava fogo, com as lágrimas caindo pelo avesso. As paredes brancas, iluminadas pela luz fria, pareciam menores. Apertadas. Diminuta também era a dignidade dela com a urina quente descendo pelas coxas. 

Será que sentiriam o cheiro ácido da vergonha?

Outros, nas salas ao lado, também tentavam segurar suas vontades, suas opiniões, seus desejos, vozes, individualidades? Um grito, talvez? Porque há o direito ao grito, disseram.

Fora dali, quem sabe.

Porém, na sala de aula daquela escola particular, a professora sabia que estava cerceada. Até os corredores com suas grades avisavam que não, ali não era espaço para liberdade. Segurou, então, o xixi e o choro até o fim da aula. Controle, havia dito a voz metálica. Educação é controle.

Ela ficou cinco dias internada devido a uma infecção urinária. A voz monocórdica do médico de plantão, que não a olhou nos olhos, ameaçou: Com oito meses de gravidez, é perigoso abortar. É urgente controlar a infecção. Vozes impessoais. Ordens. Controle. Depois da licença maternidade beberá mais água e nunca mais controlará o xixi. Nem o grito, decidiu.

As paredes brancas e as grades da enfermaria lembravam as do colégio. Hospital. Escola. Presídio. Espaços milimetricamente planejados para disciplinar os corpos… Qual é a diferença de uma cela para uma sala de aula? Divagou após o antibiótico. 

O professor, sussurrou antes de dormir.