O meu campo minado
Já assistiu “As branquelas”? Lembra da cena em que uma das mulheres ensina ao detetive (disfarçado de mulher) que deve escolher uma roupa menor e forçar até caber? Pois eu cansei de fazer isso. Não era meu método consciente, mas percebi que vinha fazendo isso há muitos anos.
Na verdade, passei por muitas fases. Por razões que não precisam ser mencionadas, meu peso oscilou muito. Tive por muitos anos um máximo de 38kg para 1,52m de altura. Hoje tenho cerca de 20kg a mais e honestamente eu não quero saber quanto exatamente. Não cresci, obviamente.
O caso é que perdi a noção do meu tamanho, a noção do meu corpo. Eu era PP e hoje eu me sinto nas nuvens em usar uma roupa G. Por quê? Porque é libertador!
Num determinado momento comprei apenas roupas folgadas para não salientar a barriga. No outro, comprava roupas M ou mesmo P e me espremia para entrar, achando que tinha que ser assim já que engordei. Mas não tem! O fato é que não estou em sobrepeso, estou com gordura abdominal e facial. E não há nada de errado em aumentar o tamanho das minhas roupas proporcionalmente ao meu aumento de peso.
A idade cobra seu preço, os medicamentos que você tomou ao longo da sua vida têm efeitos colaterais, os probleminhas de saúde aparecem. É a vida.
Eu não preciso ficar parada no tempo só me sentindo cada vez mais apertada nas roupas porque “não é possível que eu já seja G”. Qual o problema? Que venha a roupa G, GG, plus size, eu não fico mais um segundo em uma roupa menor do que o confortável para o meu corpo.
Eu nunca disse que se amar e se aceitar seria fácil. Mesmo que você olhe no espelho de manhã cedo e possa afirmar “bom dia, meu amor”, imagem corporal é um campo espinhoso. Para mim, sempre foi um vespeiro, um campo minado. Eu me sentia barriguda aos 36kg. Mesmo no ápice da minha satisfação comigo mesma eu ainda olho no espelho e penso: eu podia me livrar dessa barriga.
Posso fazer dieta e academia? Posso, mas não quero. Pelo menos não para reduzir medidas. Não me leve a mal se você o faz, mas cada um estabelece os seus limites para se sentir bem consigo mesmo. E a questão toda é essa: tem que ter um limite. O limite é não se machucar física ou emocionalmente (nem aos outros por favor) perseguindo um ideal de beleza. Parece justo?
Claro que tem aquelas coisas dentro do limite que estou disposta a ir que posso fazer para me sentir melhor comigo mesma. Afinal, cuidar de si mesma aparece no exterior. Inclui se sentir mais bonita, por que não?
E vou continuar escolhendo minhas roupas no meu estilo criativo, como já me qualificaram, e me vestindo de forma um pouco incoerente com a minha idade da certidão de nascimento. Só serão roupas um pouco maiores que antes. Eu não me importo. Sou eu que tenho que me sentir bem, certo?
Rafaela Andrade Almeida nasceu em Salvador (Bahia) em 1987 e é psicóloga na Universidade Federal do Oeste da Bahia. Tia de um casal sorridente, vive com seus sete gatos e, depois de afastada desde a adolescência, voltou a escrever e desenhar no final da quarentena. Tem uma crônica publicada até o momento, na antologia “Bom dia, meu amor”.
@rafa_fievel