O Plano é este:
as distâncias se ampliam.
Não há espaço que comporte a vastidão brasiliense
e seus contemporâneos concretos,
corações de pedra viva
feito quartzo chapadense.
O místico meridiano que corta o Cerrado
conecta Brasília pelo ar, invisível linha de costura
tecendo os espaços urbanos.
Por isso tantos encontros,
paradoxais pelas amplas distâncias
e o candango dizer: Brasília é um ovo.
Ainda que epicentro de quadrado
é feita de arredondamentos: o Museu,
as ondas ausentes da piscina
e os quentes corações cerratenses
de onde deságuam cascatas de amor.
A equívoca fama desta terra
visitada por desavisados
é de habitar aqui gente fria: mal sabem
do sol que queima sobre nossa cabeça
cotidianamente
e flameja no peito,
desconhecem as raízes profundas
que fincamos em solo cardíaco,
ainda que expondo copas tímidas e retorcidas.
Superfície é terra dos desapercebidos,
por isso não me importa ser chamado frio
coletivamente.
As amplas distâncias brasilienses
são terra fértil pra novos enraizamentos,
os vastos espaços existem
pra serem preenchidos. A ausência
de que cidade ainda seremos
é um extenso céu azul de setembro,
ares férteis, chuvas alvissareiras
e cachoeiras no horizonte.
Pode que haja poeira e sangre o nariz,
mas sempre que desenterro minha raiz
é pra um pouco mais orgulhoso anunciar:
sou de Brasília,
em breve pra lá voltarei
eterno saudoso de minhas profundezas cerratenses.
Dança-ação,
dançam músculos
moléculas e ventos,
dançação de subjetividades
o invisível em movimento.
Dançar faz florescer:
desabrocha-se ser
sons, sentimentos
oceano em sensação.
Dançar embala as águas internas
ao som de cantigas do coração.
Corporificam-se as profundezas
do oculto mar cardíaco, transbordante
pelos poros das células a vibrar.
Vida microscópica
aparentemente sozinha
autossuficiente
mas inventada em coletividade inerente:
hexágono do corpo-colmeia
abrigo de mel e ferrão.
Células dançam
e metabolizam veneno em néctar
suam sentimentos em doces rios
desaguantes no espaço.
Se todo corpo dança
(ainda que não se saiba)
e cada célula pulsa
ainda que à distância de vastos isolamentos físicos,
telas estúpidas e quantas quarentenas,
não há ausência que dissolva a energia
a bailar os átomos do ar.
Coletivizam-se em coreografia interdependente
intuitiva porque visceral,
vívida vibrante,
conexão resiliente.
A dança nunca é só
pois todo corpo é célula
e cada célula é vibração.
O primeiro poema já foi publicado em vídeo-declamação pelo Instituto Rosa dos Ventos, no edital de Poéticas Populares de 2022 (https://www.youtube.com/watch?v=mBQ7aXCOmMM&t=327s a partir do minuto 5:27). O segundo já integrou um vídeo como declamação remixada, de um projeto de dança e performance (https://www.youtube.com/watch?v=_KNfYCKf2NY)
Lucas Souza, brasiliense, atualmente reside em Valparaíso – GO. Professor de yoga e poeta, é membro titular da Academia Valparaisense de Letras. Integra coletâneas literárias, produz zines e teve seu livro de poesia – Da Vida ao Mistério: Amor (Ed. Avá) – lançado na 36ª Feira do Livro de BSB. Foi selecionado em editais de declamação de poesia no DF (Poéticas Populares, 2022) e GO (CLAQUE, 2023).
@lgcdsouza