haicai paisagístico
passam num borrão
as vãs paisagens: perdido
no próprio pensar.
Vini
Fui.
Vi, vivi, venci.
Voltei, também.
Por fim, caí em desuso
E repentinamente
Todas as questões me eram permitidas:
Tudo podia.
Dentre elas, porém,
Fiz-me a mais infeliz:
Mas se tudo pode
Posso também eu?
João
E agora, João?
E agora,
Que jazes miúdo, ressecado,
Estrebuchado no chão?
E agora,
Onde andam seus ídolos
Seus gurus messiânicos,
Seus espelhos de prata,
Sua áurea ilusão?
Por onde se encontra
Seu delírio
Feito realidade
Seu escapismo perene
Sua doce distopia?
Onde é que estaria
Se assim pudesse
Se assim te coubesse
Fugir a quem
Nunca te quis?
De que valeu
Renegar
A sabedoria de outrem
E dispensar conselhos
Em prol
De delírios
De jardins fantasmagóricos
Repletos de futuras
Doçuras nunca concretas?
Você se arrepende, João,
De trocar seu hoje
Pelo nunca
Seu lento futuro
Pelo ágil declínio
Sua possibilidade
Por decadente desilusão?
Está sem vida
E vida você já teve
Está sem pulmões
E sem escapes
Sem risos e sem choros
Sem parafina
Pois queimou já a vela
Em meros instantes
Até o mísero fim
E enfim
Não veio a fantasia
E tudo acabou
E tudo ruiu
E tudo definhou
E agora, João?
Sua amarga palavra
Seu instante insone
Sua limalha de dígitos
Sua revelação ressentida
Sua aposta garantida
Seu presságio profético
Seu silêncio anti-kármico
Sua inconformação - e agora?
Sem a chave na mão
Quer abrir a porta:
Não existe como nem por quê.
Quer morrer rei
Mas o absolutismo acabou
Quer ir a Pasárgada
Pasárgada não há mais
João, e agora?
Se você calasse
Se você cumprisse
Se você escutasse
A valsa vienense
Se você dormisse
Se você descansasse
Se você vivesse ...
Mas você não vive,
Você é duro, João!
Sozinho num quarto
Inexistente espaço
Oculto da vista
Mas sem se ocultar
Você galopa
Mas não corre
Você fica, e não foge,
Você continua, João!
João, para quê?
Ian Anderson Gomes Dias é um poeta de Manhuaçu, Minas Gerais. Recebeu o Certificado de Mérito Cultural da Academia Manhuaçuense de Letras por seu livro “Ser ou ser o ser” e participou de várias antologias poéticas, como Outros 500 e Infâncias, da Editora Toma Aí Um Poema. Escreveu também prosa para a editora Cartola, revistas literárias, como a Traços, e para a antologia do Prêmio Off Flip 2022.
@maisumautor e @iangomesdias