Queria que não doesse
Essa dor que agoniza
Esse berro na garganta
Essa voz que não é ouvida
São tantos entalos presos
Que a fala tem receio
De sair sem muita afirma
E quando sai treme de medo
E por muitas é engolida
Porque é voz de corpo torto
É fala de uma desprovida
São palavras entaladas
Engolidas pela vida
Mas nos corredores dos hospitais
Minha voz ecoou
E não foi por discursar
Mas era de tanta dor
Porque queriam me tornar
Aquilo que não sou
Lembro que minha infância
Foi roubada desde cedo
E sempre com muito medo
Carregada horror
E nos corredores dos hospitais
Eram crianças de grandes anseios
Se submetendo a tantos meios
Sentindo forte pavor
E nos rasgaram por inteiros
Pelas mãos de seu doutor
E não tinha anestesia
Era tortura meu senhor
E enquanto vocês
Se anulam da obrigação
São corpos como os meus
Que gritam sem opção
Que são mutilados o dia inteiro
Para se encaixar no teu padrão
Eu sei o que é dor
Eu sei o que é medo
Eu sei o que é pavor
E quando lembro
Aí tá doendo
tá doendo
tá doendo
Para, para, para
Aí, aí... Aí
Aí de mim que sou fraca
Mas ninguém me escutava
Meus nervos foram rasgados
Meu corpo violado
E sem nenhuma opção
Foi então que eu criei
Resistência nas minhas mãos
Pra poder rasgar a punhos
Os médicos como punição
E ainda hoje
Eu preciso ter que lidar
Com todo seu capacitismo
Se meu corpo fosse aceito
Nada disso teria acontecido
Eu não preciso de cura
Não estou adoentada
Preciso de inclusão
E porque não, não ser amada?
Nem vou me prolongar
Sobre a minha solidão
É que eu também sou gente
Não preciso de pena
Mas sim de aceitação
Também tenho voz
E não apenas gritos
Mas por muitos esquecidos
Por alguns nem ouvidos
Que acham que não existo
E que sou apenas ilusão
Uma falha
Erro de formação
Só porque esse corpo corrompe
O caralho do teu padrão.