AQUELE COM MAIS VEGETAIS OU BOAS PLANTAS
Decidi que hoje ia sair de casa e conhecer um shopping novo.
Esse que acabo de entrar me parece excepcionalmente agradável. Alguns vizinhos já comentavam da sua beleza, que merecia uma visita – mas poucos haviam ido ao shopping de fato.
A primeira coisa que chama minha atenção é a climatização: de onde eu vinha fazia muito calor, mas uma vez aqui dentro eu sinto um clima bem suave. Algo que vai contra os típicos shoppings, que costumam ser tão frios.
Meu primeiro passeio, então, é em um corredor muito gracioso e que contem as lojas mais importantes do shopping. Há uma circulação intensa de pessoas e a maioria tira fotos de cada detalhe das vitrines. Isso não me surpreende: me encanta o bom gosto arquitetônico e de design delas, tão majestosos. Um ou outro se destaca ainda mais por sua singularidade e suas cores, um pouco kitsch se me permite dizer. Nunca vi lojas tão bem trabalhadas em seus detalhes. No entanto, não entro em nenhuma delas – e me parece que tão pouco os outros visitantes ali. Por incrível que pareça, as aparências das lojas eram mais interessantes que seus produtos em si.
Saindo desse corredor, chego em uma grande praça no núcleo do shopping. Dali, posso ir a qualquer parte: corredor, calçadão. Vejo também que dali partem todos os meios para se deslocar entre os andares do shopping: elevadores, escada rolante, as próprias escadas... O que destaca, porém, é como essa praça está cheia! Sentados à beira da fonte, ao centro, uns amigos comem seus lanches e bebem cervejas; andando (ou melhor, correndo) na direção contrária da minha, uma garota que acredito ser uma supermodelo leva sacolas das mais caras grifes de moda compradas ali; mais ao fundo, uma família faz uma selfie. Eram pequenos mundos, contidos em uma única praça.
Logo me distraio com um anúncio, à esquerda, para conhecer a parte nova do shopping. Mal dou alguns passos e já chego no local, quase num piscar de olhos. Realmente, os corredores ali são mais largos, as lojas aparentam ser mais novas, tudo muito prático e bem planejado. Mas é menos frequentado que o resto. Talvez porque as pessoas preferem a parte mais antiga e tradicional do shopping.
Fico com vontade de conhecer o terraço. Pelas conversas que captei ali até aquele momento, muitos comentavam a vista belíssima que tem lá: é possível ver todo o shopping com suas lojas magníficas, as praças, o espelho d’água, os jardins, os diferentes andares – até mesmo apontar as diferenças entre a parte nova e a parte antiga. Nem duvido.
Mesmo pagando um preço abusivo pela experiência do terraço, me pego vendo tanta gente tentando registrar a vista com suas câmeras que é praticamente impossível enxergar algo. Para não sair dali frustrado, resolvo reparar nas pessoas aglomeradas naquele espaço.
Muitos casais preenchem o local, mas um que está discutindo chama minha atenção. Me esforço para entende-los. Aparentemente, eles têm uma divergência quase política. O homem quer sair da casa dos sogros para viver independentemente com sua mulher e filhos; a mulher discorda, acreditando ser melhor emocionalmente e economicamente se eles continuam onde estão. O marido propõe consultar também os filhos, já que eles serão afetados por uma decisão tão importante – a mulher diz que vai pensar. Tenho a sensação que essa discussão ainda tomará muito tempo, e por isso desvio minha atenção para outro ponto.
Três meninas e um homem andam juntos. Todos os cumprimentam e parecem conhece-los, mas para mim eles são estranhos. As meninas conversam entre elas, muito animadas, enquanto o homem – provavelmente o pai – está mais adiante. Uma das meninas está de roupa amarela e comendo um pêssego, muito radiante; outra, emanando graciosidade, usa uma coroa de flores na cabeça; a última, mais introvertida, bebe um suco de uva de caixinha, olhando tudo e todos com certo desdém. Em desacordo a tudo isso, o pai se mantém sério, frio, carrancudo – é impossível não sentir sua presença.
Olho ao redor e tento fazer um aparato geral das pessoas ali. Vejo muitos bastante apressados, se esbarrando o tempo todo em mim, enquanto outros são tão consumistas que levam sacolas e sacolas de coisas que não precisam. A maioria está preocupada até demais com sua aparência. Impossível não comparar esse ambiente com o carinho que eu tinha em casa, com minha família. Sem muitas preocupações, gente tranquila... Talvez... Penso que teria sido melhor ter ficado em casa.
henfil tem um mestrado em estudos teatrais pela universitat autònoma de barcelona e atualmente trabalha como assistente de direção + produtor no audiovisual. almeja se tornar um roteirista e tem seu primeiro curta em pré-produção no momento. no tempo livre (não tem muito), escreve contos, poemas e letras de músicas.
@henriquefho