Procuro o impenetrável das coisas. Observo a profundidade daquilo que não tem forma, indeterminado, transformado pela visão daquele que aprecia o adverso das coisas, o que não tem nome, forma ou cor. Os inclassificáveis. Talvez, a razão de tamanha obstrução do equilíbrio que o mantém vivo, desqualificado para o lado certo dos fatos que o retiram dos coletivos.
No constante ressurgir, resgata do fundo poço do interno (inferno), o infinito. Desafio que torna significativo o exercício contra a penitência de uma execução controlada para o constante vazio.
A recomposição que persegue o nada. (vazio)
Espera a cada instante solitário, a sua chegada, aparição do encantamento. Desejo que o mantém ativo. Entre erros, desconhece os fatores que coincidem com o encontro do nunca, ou ele nunca chega. O pensamento ultrapassa o negacionismo abstrato.
Diferenças existem no exercício do olhar para além das coisas.
A reconstrução pós-frustração daquele que aguarda. Sinais que confirmam o inevitável já concebido pelo comportamento previsível daquilo que nunca chega.
A afeição acontece no imprevisível, cada um oferece aquilo que entende pelos sentidos.
Não dado á reciprocidade, aguarda.
A dúvida é sobre o esforço executado pela troca, a recompensa, mas não cabe em tudo que existe. Essa dádiva é o sagrado que pulsa cada corpo que vibra.
Os primeiros fios de cabelos mortos começaram a aparecer, percebi isso após superar a queda que rasgou partes de meu corpo, as dores permaneceram por alguns dias, somadas as que já estavam adormecidas no efeito dos sentidos. Falências repetidas, riscos que correspondem á quedas, o tempo faz o desgaste do destino, incerto, porém ainda o desejo prevalece na dor. Retornam acontecimentos que se fazem diferentes na memória.
A carne humana grudou no alambrado da quadra principal, localizada nas dependências do Condomínio Residencial Esmeralda. Doze anos de “vida”, e o cheiro ainda permanece no olfato de um corpo que presenciou a matéria em deterioração. Aquele vermelho tornava matéria morta, no processo lento de um corpo em choque, solitário em risco, convertido em cinzas no canto inferior do cercado que isolava o morto dos demais, vivos, insensíveis ao toque. Nada de público no cenário do meio dia, segmentado pela rotina.
O alarme soava como grito discreto, feito sofrimento permanente em punição simples de existir.
(Em memória á um trabalhador anônimo do Condomínio Residência Esmeraldas)
Quando ingressei no sistema que educa, o processo foi lento e gradual, sem escolha e contrária a minha vontade, era o único acesso permitido naquele inicio de carreira. Entrei em diferentes instituições, sem conhecimento de vista declinei em quedas, doloridas e com dificuldade na recuperação, porém reerguida por necessidade de sobrevida. Permanências e transitoriedades, desejando vínculos precisos, sempre em busca de significados e relações legítimas conjugadas, porém o transito impreciso impedia acessos mais profundos, mas o exercício da reinvenção se fez constante no corpo tímido destemido. Encontrei estruturas fechadas, variantes na localização geográfica, porém em todas atravessei corredores longos, alguns escuros, outros mais claros, no absurdo susto vivenciado em cada conflito adentro de cada porta atravessada, entrada e saída sem efeito, acumulando vivências que pesam o corpo , e aos poucos perde os sentidos , segue refeito impedido de vida. Em tempos e tempos , crivado, a exaustão quase se faz, mas o mesmo é relutante na reintegração que regenera o organismo em oscilações do imperfeito, no quase desfeito em um sistema que educa por afetos, menos dóceis de como poderia ser. Fixo, atuação movente em duas instituições, busca ativa de significativos no campo do conhecimento. Dois, quatro, oito anos, em esforço solitário no local que promove anualmente o movimento da união profissional, reivindicações quase impossíveis de serem aclamadas por falta de percepção, audição, visão e emoção de uma sociedade que falseia relações e intenções. O mesmo corpo agredido e ofendido compartilha com alguns pares semelhantes na constante execução funcional, carregando a carga de seu desgosto diário, improdutiva a favor do outro que engana no cumprimento de suas obrigações, escondido pela sua fala e postura de bondade conveniente, ganha o jogo, preserva a sua energia que o mantêm apropriado, adaptado ao sistema de repressão reprodutiva. Fixa feito humano institucionalizado, relutante no que sente e no que deve fazer no cumprimento de dever, receptivo a agressões físicas, orais e morais, impedido de reação pela prestação de serviço social. Fala inaudível, somente verbal, acumuladas como documentos burocráticos, a farsa democrática em seu âmbito mais puro da palavra. Ouvir o outro, independente de sua condição funcional, idade, atuação ou condição. Matérias orgânicas feito reagentes em sua natureza sensível, contra interesses capitalistas da aparência profissional. Vigilantes instalados feito máquinas fixas, e corpos transitórios que veem, escutam falas e comportamentos legítimos contra ideais prestativos a favor do “bem estar” nas relações que aniquilam o diferente, incoerência comportamental, a atenção se faz por interesses políticos que visam disputa por imagens de corpos dóceis. As máscaras físicas não abafam.
Silvia Maria Garcia Pinto, Silvia MH – São Paulo/1977. Atualmente vive e trabalha em São Paulo. Bacharel em Artes Plásticas pela Universidade São Judas Tadeu em 2000. Licenciada em Educação Artística pela Faculdade Belas Artes em 2005. Atua como arte educadora em duas escolas na rede pública de São Paulo e em um colégio particular, todas localizadas na região leste de São Paulo. Paralelamente, desenvolve pesquisa e produção em artes visuais, explorando diferentes linguagens na investigação sobre o corpo e suas relações, enquanto matéria afetiva, feita de memória e complexidades, muitas vezes indecifráveis, por apresentar comportamentos transitórios
@silviamh4